11.7.16

Sinais de fumo


(The Durutti Column, "Duet With Piano", in https://www.youtube.com/watch?v=6vfJf_SzthA)

Sazonais pássaros deixam
cantos rasantes nas paredes alvas.
Os ombros pesam
como se a neblina matinal
tivesse o peso do chumbo.
Dizia-se que os portões de ferro
eram o logro de onde se punha vista
no estuário de prata.

Mas depois
uma curva apertada
interrompia os pés descalços.

Uma curva apertada.

Depressa as mãos tomaram cama no piano
e arpejaram cores ciciadas
nas gotas frias da chuva a destempo.
Tomara que as retas não se juntassem
em planícies sem fim
em planícies à espera de searas fartas.
E se os corpos se dão ao medo
ao medo de curvas apertadas,
curvas sem aviso
(curvas ao acaso),
um murmúrio quente depõe ao ouvido
da mulher amada:
como o mundo inteiro sobra
quando as mãos se aconchegam
num castelo de reis.

O piano devolve a tapeçaria que terça
o templo onde o tempo se demora
enquanto as mãos se beijam em auroras doces
e os amantes entram nos olhos recíprocos.
Ditando palavras cheias
palavras rios
e palavras açambarcadas
o ouro arregaçado em mangas rotas
e a janela desembaraçada à espera do mar,
onde o sentido maior segreda:

somos nós
e nós apenas
os curadores dos campos
onde se colhe o amor.

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