20.8.16

Homem do mar

Sentado no paredão encardido
pelo tempo todo que foi testemunha do mar
o homem revistava os quadros contumazes
os dedos pueris
as poeiras açambarcadas em batéis frágeis
as voltas que o trouxeram a lado nenhum.
No seu perfeito inacabamento
(matéria volúvel que se sabia ser)
o homem tinha regimento do mar
como leito ideal para as revisitações.
Por mais que dissesse
para o mais profundo do seu pensamento
que o resgate do tempo era um ultraje:
arremetia pelo lençol aguado do mar
e compunha os tributos de antanho
à medida que se perfilavam no desfiladeiro.
Não o incomodavam aflições internas
as que anotavam contradições que o sitiavam:
bem dizia
com a ênfase que lhe era conhecida
que o pretérito era um gasto inútil,
como depressa tinha o mar
como pano de fundo
para as memórias que urgiam resgate
possivelmente
do fundo do mar.
Com essas contradições podia ele;
se preciso fosse
diria que as comparências perante ao mar
eram sua caução como homem do mar.
E que isso não tinha valor
(Cotejado com as minudências
da repristinação do pretérito:
critério contabilístico de apuramento
da grandeza do tempo tido entre as mãos).
Do mar
enquanto homem do mar
trazia o sal que ditava
constelações inteiras
fogueiras vivas deitando cinzas terapêuticas
em movimentos sucessivos de reinvenção
de onde sobejava,
homem do mar,
a plenitude possível.

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