O lento deitar do dia
servido na maresia
deixa o ar a levitar nas mãos
enquanto se sopesam os degraus
entre o sopé do miradouro e a casa da partida.
Não será a estrelar figura deitada
a fazer-se meã
no avesso da noite dormida
a vertigem sem medida na boca do precipício.
Sem os violinos
a música ensurdece
e eu congemino as margens
de onde se alinhava
a antítese da solidão.
Um fósforo acerta a chama em erupção
furacão promitente
entre a mansidão dos vales
refém do olhar insubmisso;
talvez se arranjem desenhos frágeis
e das fráguas indomáveis
um ciciar constante emoldure os versos capazes,
a cadeira onde se deitam poemas incertos.
Um chamamento audível
ecoa nas nuvens velozes:
não traduzo o idioma
ininteligível
mas soam musicais aquelas palavras
sílaba a sílaba
como se houvessem sido convocadas
em substituição dos violinos.
As luvas perdidas no chão
pressagiam o inverno
– ou então,
a finitude do inverno
e a imprestabilidade das luvas,
as mãos carecendo de liberdade
para seus poros respirarem.
O cais não se segreda
na passividade do entardecer.
Deita-se ao tempo fraturado
e dele esvoaçam os espíritos caldeados
de marinheiros datados.
O cais
recebe as águas amansadas
prepara-se para a noite que já é véspera.
Os improdutivos medos
perdem inventário:
já não se abespinham os desassossegados
nem se atemorizam os tementes do porvir
nem se encomendam ao desengano
os novos eleáticos do mapa apresentado:
doravante
em sucessivas camadas de fuligem desaprovada
filiam-se os corpos na sua filigrana
e os dedos percorrem cada milímetro
como se de quilómetros cuidassem.
Os corpos
caudais de rios desemudecidos.
Já não há
medos transversais
penhores atrasados
espartilhos denodados
espadas dilacerantes adejando sobre as cabeças;
só há o rio
que se acama em seu estuário
rio descendente de mitológicas figuras
rio
descendo na sua sede de mar.