17.5.18

Dois gumes

Num rosto tingido a suor
o revólver desembainhado
costura a ira 
que não chega a ser alvorada.
O coldre descosido
deixa um líquido restolho
a outonal seiva
e o cachalote à deriva 
fica à mercê dos caçadores.
Em inesperado golpe de sorte
uma onda avassaladora colhe os caçadores
e o cachalote moribundo
refaz-se na companhia das balas perdidas
olhando-as como carrasco malogrado
como olha 
para o rosto assustado dos caçadores
boiando na espuma do mar.
O caçador torna-se presa
como quem vira um avental do avesso
e joga os dados outras vez
à espera de vez 
para regressar ao pedestal
onde se fruem as vítimas dos infortúnios.
As facas 
têm sempre dois gumes.

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