“Pois o dia é breve.
O dia é tudo.”
Virginia Woolf, “Orlando”.
Um amontoado de verbos
esgueira-se da manhã
no tirocínio vagaroso do funicular
onde vem o dia
e sem saber se nuvens são seu leito
ou se um veludo soalheiro lhe empresta húmus.
O dia que se segue
não é este que é sua véspera;
é o dia que canta
no gorjear das pessoas que se encostam à cidade
no dorso leve dos relógios desacertados
no beijo quente
à frente de relógios sem ponteiros.
Encontrem-se os braços turgidos
as maçãs dos rostos ruborizadas
e não é pela vergonha;
sentimos o pesar do tempo
sentimos a incandescente vela de onde vem luz
e arrasta-se o dia
desapressado
ele próprio esbulhado de dia que é
na imagem retida pelos dedos famintos.
Temos fome
do dia sem interrupções
e, contudo,
o dia emoldura-se na perene textura dos corpos
e deles bebe a mesma imorredoira eloquência.
Somos nós
que fazemos do tempo
o tempo que ele é;
somos insubmissos
e não capitulamos no vazio onde se consome
o tempo devorador:
não sabemos o que é
pois sem nós
não tinha o tempo seus tutores.
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