25.11.16

Sacrilégio

O sol tardio endossa aos campos
as mangas arregaçadas do outono,
à espera das estrelas cadentes
de um céu cheio
e da chuva benigna. 
O camponês não tem conta das horas
nem sabe estimar o tamanho da sementeira
enquanto as flores medram na tibieza. 
Pedem água ao outono,
os camponeses,
para não se empenharem
nos vícios do estio prometido. 
Alguns medram na ociosidade de vícios outros,
inconfessáveis
sob a vergasta dos costumes bons. 
Tiram réditos da precaução das colheitas,
gastam nas licenciosidades
protestadas por damas de bom nome. 
O sacerdote esquece-se da moral na homilia
e devota-se ao olvido ao sair do confessionário. 
Dizem
as damas de bom nome
que o lugar está condenado à perdição. 
Desconfiam da (dizem: desleal) concorrência
e tecem-se em prantos
pela omissão dos prazeres desviados
(tirando algumas disfarçando contentamento
pela ausência dos consortes 
no império dos deveres inerentes à condição). 
Quando derem um salto no tempo
hão de tirar o véu à má colheita. 
A água pedida ao outono
retesada nos quartos sórdidos das peritas
e dos réditos transviados
que ditaram a falência da empreitada. 
Foi pena. 
O outono fez-se a preceito. 
As águas das chuvas
tiveram a mesma perdição. 

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