1.3.17

Império

O contraste lunar nas costas nuas
no dobrar quimérico
nas mãos aquecidas
nas lágrimas viradas do avesso
um rosto cinzelado nas ruínas do prazer
no inconfessável mar proibido
nas rodas dentadas que não se aquietam
e na promessa de um amanhã igual
(pelo menos),
os retrocessos vedados no vocabulário.
Ah!
sobra nas esquinas de mim
aquele mel sem cor
o mariscado néon vertido pela lua-império
a alvura de tudo misturando-se com tudo
na sublime ênfase da soberana vontade nossa.
Escrevemos no ar,
com os dedos entrelaçados
em movimento contínuo,
as estrofes que são o sortilégio nosso
as camas testemunhas
os olhares singulares
os esteios arpoados
a saliva sentida,
quente
as roupas sem corpo
e o corpo que pede meças ao corpo sua metade.
Oxalá sejam intemporais
os vestígios de loucura
as baias que se desfazem no sargaço colhido
a entronização do que somos,
soberanos.
Se contarem com o vento púrpura
adornado pelos nossos lábios
como jogamos os braços numa coreografia
e da varanda sobranceira
guardamos os segredos,
o nosso desmedido património.
Misturam-se os cabelos
com a porosa teia do mar.
Somos o forro do tempo
a caução cantada no imorredoiro cabaz
que trazemos a tiracolo
no céu uníssono que desenhamos
com as mãos insaciáveis.
Somos o forro do tempo
sem esquecer de o consagrar
às divindades que residem em nós
– às divindades que somos nós.
Somos tutores da manhã ampla
dos marcos geodésicos a que subimos
das nuvens que apascentamos desde o vértice
com a chuva à mão de semear.
E de um porvir que não leva fim.

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