30.7.18

Autoteatro

Desossado
fiz o papel de mim
nesta peça sem preâmbulo. 
Suei a carne viva
no corrimão da estufa outonal
sem conselhos de previsão
ou oráculos em fornos avivados.
Por dentro da espátula forçada
não soube dizer
se foi difícil o papel de mim mesmo:
exigi o desprendimento cautelar
a emulsão de mim no seu exterior
nos preparos desarranjados
em constante vociferação
contrariando a corrente do cais.
As vezes que admiti
ser a personagem de mim mesmo
foram as mesmas
que adivinhei ser sacerdote
envergar uma sotaina e pregar mandamentos
ou a farda estiolada
e pregar em paredes nuas.
À saída do palco
dir-se-ia vir detido pela diferença.
Fazer de mim
contra os estilhaços de um espelho
(estes eram os preparos do palco
entre a fuligem noturna
e uma audiência em silêncio 
– ou, por vício de escuridão, 
de audiência sem audiência)
foi como tirar uma fotografia do avesso
e dar ao tabuleiro o mesmo jogo.
Folgo em saber
que não havia vivalma na audiência.

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