4.7.18

Douro

As minhas mãos sabem 
do aroma de um corpo.
São tutoras de um mapa
nas entrelaçadas vozes de um coro.
Nos raios emergentes da alvorada
a maresia levanta-se na frontaria 
e não sabemos 
do paradeiro dos escombros
dos vultos furtivos;
só tomamos conta
do verbo que sinaliza o despojamento
em estrofes com sílabas dedilhadas
num fundo sem fundo
onde somos património imaterial.
Não é de salvação que se trata;
anotamos num caderno envelhecido
as palavras em falta
mesmo que sejam inventariadas no instante
e delas só sentimos falta
por delas ter havido lembrança.
As gotas do orvalho
desenham diques no vidro da janela;
podíamos certificar
que usando as gotas do orvalho
escrevíamos as palavras em falta
num lado da janela
enquanto na outra metade
combinávamos as palavras sortilégio
as que se soltam do ouro dos nossos dedos
matricial aroma do desejo
no desembaraço dos sentidos hasteados.
Podíamos 
açambarcar o resto da manhã
na quimera à nossa mercê
cingir os corpos em forma de pétala
balbuciar o diadema em transgressão
ou apenas 
capitular no sono heurístico
e na pele dos sonhos 
erguer o sonho mais alto
de que somos curadores únicos.
Diríamos o que apetecesse
contra as convenções
contra os levantamentos 
dos insuspeitos velejadores da decência
a favor da vontade 
da soberania da vontade
sem contracenar com vultos intrusos
e, em total deslimite,
em total inimputabilidade das regras,
diríamos 
como se soletra o amor.
Só para termos mnemónica
e dele tirarmos o alvará centrípeto
as cores imorredoiras
a tábua rasa onde compomos o devir.

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