6.7.18

Fugi da cidade

Fugi da cidade
da teia monstruosa de olhares
dos gatos vadios, furtivos
da coreografia de vaidades
do magro destino imerso no vazio
da frenética adulação ensimesmada
das casas sem janelas
dos rostos desapalavrados
da boçal revelação dos habitantes
dos apoderados que tresleem a cidade
da indiferença das almas despovoadas
da imensidão das praças sobrelotadas
das meteóricas aparições dos notáveis
dos notáveis 
(outra vez: dos notáveis
putativos filhos diletos
autoconsagrados embaixadores 
do sentir da cidade,
seus adulteradores máximos);
fugi da cidade
do que se esgrime no trânsito demencial
das árvores enodoadas pelo ar impuro
dos mendigos de olhos encovados
da farsante vacina da modernidade
do turismo panaceia, ou turismo pandemia
do sol embaciado na névoa teimosa
da geografia da cidade
e da sua garbosa identidade
(como se diferença fosse superioridade).
Fugi da cidade.
Agora
tenho uma janela
e o mar inteiro sob as minhas mãos.
(E sinto-me maior que a cidade,
sua provável antítese.)

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