6.10.17

Colosso

Desisti do lírico amparo do mundo.

Não que o mundo não mereça;
não quero mais mondar as margens volúveis
não quero
naufrágios em berço de ouro
facas fundas a boiar em nenúfares sem culpa
as ruidosas crianças
sem adivinharem o pleito doravante
e as buganvílias decadentes 
na ilharga da estiagem.

Vingam-se as nuvens sem rosto
em apuradas incisões por dentro da carne
em cicatrizes indissolúveis
um baraço irritante que detém os movimentos.

Ah!
Se ao menos pudesse sonhar com um oásis
com prestimosas personagens seus atores
e as planícies não escondessem um ermo arenoso
enquanto à ceia
servia as palavras empunhadas pela boca faminta
nem que fosse apenas 
para ser seu singular ouvinte.
Deitar-me-ia sobre tapetes sem rugas
no dorso da noite desamparada
– e eu seu exigível amparo,
se me não esquecesse.

Meneio o olhar profícuo
à procura dos versos andantes
das paredes transparentes
dos sacerdotes sem deus
dos invulgares esteios sem cais
dos números perdidos nas equações.
Procuro
algum sentido
sem aval dos compêndios azulados da razão
sem o escudo esquecido da bondade,
apenas com a indomável gesta sem antepassados
sem sequer o patíbulo do adeus.

À espera de invenções tonitruantes
do progresso
à falta de ser eu seu fautor.

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